Visualizações

13 novembro 2016

554




Quebra-Cabeça
ROGERIO SANTOS

a vida com você
merecia pairar no tempo.

e fosse num dia azul,
amanhecendo de leve,
com sol, planos mínimos,
e sonhos aleatórios.

um cheiro de café,
o canto dos pássaros,
e o barulho das ondas
rompendo a mansidão
da Ilha Comprida.

no momento exato daquela chuva,
o limão e seus desdobramentos.

a hora sagrada
da multiplicação dos peixes
e do tilintar dos copos
e das garrafas de vinho e cerveja.

o riso exagerado,
os melhores amigos,
e a preguiça na rede.

não cabe culpa,
até as plantas estão felizes.

a brisa leve
clamando o início da noite,
a visão das constelações
e um passeio
regado de lua cheia e amor.

as mãos dadas
e as linhas entrelaçadas.

um dia desses bem comuns
que começam despretensiosos
- e jamais terminam.

quando toda conversa
que pensamos jogar fora,
monta um quebra-cabeça
que vira poesia.

nesse dia tão perfeito,
até as louças são autolimpantes.

/

06 novembro 2016

553




Vértice
ROGERIO SANTOS

vértice
a linha da vida
encontra a linha do amor

vértice
o ponto mais alto do eco
do grito-canto-canção

vértice
o tato da planta do pé
no plano incerto do cocuruto

vértice
o topo da pirâmide
aponta a ponta do iceberg

vértice
a Terra do Fogo
congela no topo da América

vértice
a palavra certeira
no bico de um avião de papel

vértice
a verdade pontiaguda
quando verte-se, é poesia




/

30 outubro 2016

552




Primeira Pessoa
ROGERIO SANTOS

um fog encobre
a próxima palavra
um gole e lá se vai
o penúltimo neurônio

o tempo é impiedoso
e não amortiza a conta

o fogo queima
a madeira do alicerce
um político castra
a próxima criança

em nome de Deus
tudo vale a primeira pessoa

o pretérito imperfeito
o futuro do pretérito
o hoje escrito em telas
que sepultam canetas

em frente do que é meu
um poeta sem estatura
reclama o que era nosso

os dedos apontam sua face
as bocas metralham frases
discursos mais-que-perfeitos
elaborados em horário nobre

a vida suplica poesia coletiva
mas é reduzida ao individualismo
- pobre